quinta-feira, 24 de novembro de 2011

A Dor

                                                   
Tudo que vive neste mundo, natureza, animal, homem, sofre e, todavia, o amor é a lei do Universo e por amor que Deus formou os seres. Contradição aparentemente formidável, problema angustioso, que perturbou tantos pensadores e os levou á dúvida e ao pessimismo.
O animal está sujeito á luta ardente pela vida. Entre as ervas do prado, as folhas e a ramaria dos bosques, nos ares, no seio das águas, por toda a parte desenrolam-se dramas ignorados. Em nossas cidades prossegue sem cessar a hecatombe de pobres animais inofensivos, sacrificados ás nossas necessidades ou entregues nos laboratórios ao suplício da vivissecção.
Quanto á Humanidade, sua história não é mais que um longo martirológio. Através dos tempos, por cima dos séculos, rola a triste melopéia dos sofrimentos humanos; o lamento dos desgraçados sobe com uma intensidade dilacerante, que tem a regularidade de uma vaga.
 A dor segue todos os nossos passos; espreita-nos em todas as voltas do caminho. E, diante desta esfinge que a fita com seu olhar estranho, o homem faz a eterna pergunta: Porque existe a dor?
É no que lhe concerne, uma punição, uma expiação, como o dizem alguns?
 É a reparação do passado, o resgate das faltas cometidas?
Fundamentalmente considerada, a dor é uma lei de equilíbrio e educação. Sem dúvida, as falhas do passado recaem sobre nós com todo o seu peso e determinam as condições de nosso destino. O sofrimento não é muitas vezes mais do que a repercussão das violações da ordem eterna cometidas; mas sendo partilha de todos, deve ser considerado como necessidade de ordem geral, como agente de desenvolvimento, condições do progresso. Todos os seres têm de, por sua vez, passar por ele. Sua ação é benfazeja para quem sabe compreendê-lo; mas somente podem compreendê-lo aqueles que lhe sentiram os poderosos efeitos. É principalmente a esses, a todos aqueles que sofrem, têm sofrido ou são dignos de sofrer que dirijo estas páginas.
Tirado do livro Páginas de Léon Denis: Sylvio Brito Soares FEB

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

De um velho para um novo

Você já foi criança um dia, mas os seus anos se dobraram e fizeram de você,
um jovem adulto, e agora você me olha com certo desprezo, só porque muitos
anos se dobraram para mim e, hoje sou um velho.
Você observa minhas mãos trêmulas e encarquilhadas e se esquece que foram
elas que ajudaram a acariciar as suas, inseguras na infância.
Critica os meus passos lentos e vacilantes, esquecendo-se de que foram eles
que orientaram seus primeiros passos.
Reclama quando lhe peço para ler uma palavra que meus olhos já não conseguem
vislumbrar com precisão, esquecido das várias palavras que eu repeti
inúmeras vezes para que você aprendesse a falar.
Fala da lentidão das minhas decisões, esquecendo-se de que suas primeiras
decisões foram por elas balizadas.
Diz que eu sou um velho desatualizado e sem estudo, mas eu confesso que
pensei muito pouco em mim, para fazer de você, um homem de bem.
Reclama da minha saúde debilitada, mas creia muito trabalho foi preciso
para garantir a sua.
Ri quando não pronuncio corretamente uma palavra, mas eu lhe afirmo que
esqueci de mim mesmo, para que você pudesse cursar uma universidade.
Diz que não possuo argumentos convincentes em nossos raros diálogos,
todavia, muitas foram às vezes que advoguei em seu favor, nas situações
difíceis em que se envolvia.
Hoje você cresceu e é um homem robusto e a juventude lhe empolga as horas,
você esqueceu-se de sua infância, seus primeiros passos, suas primeiras palavras,
seus primeiros sorrisos, mas acredite tudo isso está bem vivo na memória
deste velho cansado, em cujo peito ainda pulsa o coração amoroso de outrora.
É verdade que o tempo passou, mas eu nem me dei conta, só notei naquele dia
em que você me chamou de velho pela primeira vez e, eu olhei no espelho, lá
estava um velho de cabelos brancos, vincos profundos na face e certo ar
de sabedoria, que na imagem de ontem não existia.
Por isso eu lhe digo meu jovem, que o tempo é implacável, e um dia você
também contemplará o espelho e perceberá que a Imagem nele refletida não é
mais a que hoje você admira, mas você sentirá que em seu peito, o coração
ainda pulsa no mesmo compasso; que o afeto que você cultivou, não se
desvaneceu; que as emoções vividas, ainda podem ser sentidas como nos velhos
tempos; que as palavras amargas, ainda ferem com a mesma intensidade; e que,
apesar dos longos invernos suportados, você ficou frio diante da indiferença
dos seres que embalou na infância.
Por isso que lhe aconselho meu filho, não ria nem blasfeme do estado em que
estou, eu já fui o que você é, e você será o que hoje sou.
Momento Espírita
Repassando uma amiga me mandou.

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Toda a lei se resume em dois mandamento

Na ótica espírita
kardec
Mas, os fariseus, tendo sabido que ele tapara a boca aos saduceus, se reuniram, e um deles, que era doutor da lei, foi propor-lhe esta questão, para tentá-lo; Mestre, qual o grande mandamento?- Jesus lhe respondeu; Amarás o Senhor teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todo o teu espírito, esse o maior e o primeiro mandamento; E aqui está o segundo, que é semelhante ao primeiro; Amarás o teu próximo, como a ti mesmo; Toda a lei e os profetas se acham contidos nesses dois mandamentos (Mateus 22:34 a 40) Caridade e humildade, tal a senda única da salvação. Egoísmo e orgulho, tal a perdição. Este princípio se acha formulado nos seguintes termos; isto é, que não se pode verdadeiramente amar a Deus sem amar o próximo, nem amar o próximo sem amar a Deus. Logo, tudo o que se faça contra o próximo o mesmo é que fazê-lo contra Deus. Não podendo amar a Deus sem praticar a caridade para com o próximo, todos os deveres do homem se resumem nesta máxima; Fora da Caridade Não Há Salvação... Evangelho Segundo o Espiritismo... Allan Kardec; FEB


terça-feira, 8 de novembro de 2011

Uma Entrevista com Judas Iscariotes

Na ótica espírita

Através da mediunidade de Chico Xavier*, o Espírito Humberto de Campos, o mais aplaudido cronista da vida além-túmulo, revela a verdadeira condição espiritual de Judas e desfaz a mitologia negativa das religiões dogmáticas que perseguem até hoje a memória do discípulo que traiu Jesus.

Silêncio augusto cai sobre a Cidade Santa. A antiga capital da Judéia parece dormir o seu sono de muitos séculos. Além, descansa Getsêmani, onde o Divino Mestre chorou numa longa agonia; acolá está o Gólgota sagrado, e em cada coisa silenciosa há um traço de Paixão que as épocas guardarão para sempre. E, em meio de todo o cenário, como um veio cristalino de lágrimas, passa o Cedron silencioso, como se suas águas mudas, buscando o Mar Morto, quisessem esconder das vistas dos homens os segredos insondáveis do Nazareno.
Foi assim, numa dessas noites, que vi Jerusalém, vivendo a sua eternidade de maldições.
Os Espíritos podem vibrar em contato direto com a História. Buscando uma relação mais íntima com a cidade dos profetas, eu procurava observar o passado vivo dos Lugares Santos. Parece que as mãos iconoclastas de Tito por ali passaram como executoras de um decreto irrevogável. Por toda a parte ainda persiste um sopro de destruição e desgraça. Legiões de duendes, embuçados nas suas vestimentas antigas, percorrem as ruínas sagradas e, no meio das fatalidades que pesam sobre o império morto dos judeus, não ouvem os gemidos da Humanidade invisível.
Nas margens caladas do Cedron, não longe talvez do lugar sagrado onde o Salvador esteve com os discípulos, divisei um homem sentado sobre uma pedra. De sua expressão fisionômica irradiava-se cativante simpatia.
- Sabe quem é este? Murmurou alguém nos meus ouvidos. Este é Judas...
- Judas?
- Sim, os Espíritos apreciam, às vezes, não obstante o progresso que já alcançaram volver atrás, visitando os sítios onde se engrandeceram ou prevaricaram, sentindo-se repentinamente transportados aos tempos idos. Então mergulham o pensamento no passado, regressando ao presente, dispostos ao heroísmo necessário do futuro. Judas costuma vir à Terra, nos dias em que se comemora a Paixão de Nosso Senhor, meditando nos seus atos de antanho...
Aquela figura de homem magnetizava-me. Não estou ainda livre da curiosidade do repórter, mas entre as minhas maldades de pecador e a perfeição de Jesus havia um abismo. Meu atrevimento, porém, e a santa humildade do seu coração ligaram-se, para que eu o entrevistasse, procurando ouvi-lo.
Humberto - O senhor é de fato o ex-filho de Iscariotes?
Judas – Sim, sou Judas (respondeu enxugando uma lágrima nas dobras de sua longa túnica). Como o Jeremias, das Lamentações, contemplo às vezes esta Jerusalém arruinada, meditando no juízo dos homens transitórios...
Humberto – É uma verdade tudo quanto reza o Novo Testamento a respeito da sua personalidade, na tragédia da condenação de Jesus?
Judas – Em parte... Os escribas que redigiram os Evangelhos não atenderam às circunstâncias e à trincas políticas que, acima dos meus atos, predominaram na nefanda crucificação. Pôncio Pilatos e o tetrarca da Galiléia, além dos seus interesses individuais na questão, tinham ainda a seu cargo salvaguardar os interesses do Estado romano, empenhado em satisfazer as aspirações religiosas dos anciãos judeus. Sempre a mesma história. O Sinhedrin desejava o reino do Céu pelejando por Jeová a ferro e fogo; Roma queria o reino da Terra. Jesus estava entre essas forças antagônicas com a sua pureza imaculada. Ora, eu era um dos apaixonados pelas idéias socialistas do Mestre; porém, o meu excessivo zelo pela doutrina me fez sacrificar o seu fundador. Acima dos corações, eu via na política, a única arma com a qual poderia triunfar e Jesus não obteria nenhuma vitória com o desprendimento das riquezas. Com as suas teorias, nunca poderia conquistar as rédeas do poder, já que, em seu manto de pobre, se sentia possuído de um santo horror à propriedade. Planejei, então, uma revolta surda, como se projeta hoje em dia na Terra a queda de um Chefe de Estado. O Mestre passaria a um plano secundário e eu arranjaria colaboradores para uma obra vasta e enérgica, como a que fez mais tarde Constantino Primeiro, o Grande, depois de vencer Maxêncio às portas de Roma, o que, aliás, apenas serviu para desvirtuar o Cristianismo. Entregando, pois, o Mestre a Caifás, não julguei que as coisas atingissem um fim tão lamentável e, ralado de remorsos, presumi que o suicídio era a única maneira de me redimir aos seus olhos.
Humberto – E chegou a salvar-se pelo arrependimento?
Judas – Não. Não consegui. O remorso é uma força preliminar para os trabalhos reparadores. Depois da minha morte trágica, submergi-me em séculos de sofrimentos expiatórios da minha falta. Sofri horrores nas perseguições infligidas em Roma aos adeptos da doutrina de Jesus e as minhas provas culminaram em uma fogueira inquisitorial, onde, imitando o Mestre, fui traído, vendido e usurpado. Vítima da felonia e da traição, deixei na Terra os verdadeiros resquícios do meu crime, na Europa do século XV. Desde esse dia em que me entreguei por amor do Cristo a todos os tormentos e infâmias que me aviltavam, com resignação e piedade pelos meus verdugos, fechei o ciclo das minhas dolorosas reencarnações na Terra, sentindo na fronte o ósculo de perdão da minha própria consciência.
Humberto – E está hoje meditando nos dias que se foram...(pensei com tristeza).
Judas – Sim... Estou recapitulando os fatos como se passaram. E agora, irmanado com Ele, que se acha no seu luminoso Reino das Alturas, que ainda não é deste mundo, sinto nestas estradas o sinal dos seus passos divinos. Vejo-o ainda na cruz, entregando a Deus o seu destino... Sinto a clamorosa injustiça dos companheiros que o abandonaram inteiramente e me vem uma recordação carinhosa das poucas mulheres que o ampararam no doloroso transe. Em todas as homenagens a Ele prestadas, eu sou sempre a figura repugnante do traidor. Olho complacentemente os que me acusam sem refletir se podem atirar a primeira pedra... Sobre meu nome pesa a maldição milenária, como sobre estes sítios cheios de miséria e de infortúnio. Pessoalmente, porém, estou saciado de justiça, porque já fui absolvido pela minha consciência, no tribunal dos suplícios redentores.
Quanto ao Divino Mestre (continuou Judas com seus prantos), infinita é a sua misericórdia e não só para comigo, porque, se recebi trinta moedas vendendo-o aos seus algozes, há muitos séculos Ele está sendo criminosamente vendido ao mundo, a grosso e a retalho, por todos os preços, em todos os padrões de ouro amoedado...
Humberto – É verdade! Concluí, e os novos negociadores do Cristo não se enforcam depois de vendê-lo.

Judas afastou-se, tomando a direção do Santo Sepulcro, e eu, confundido nas sombras invisíveis para o mundo, vi que no Céu brilhavam algumas estrelas sobre as nuvens pardacentas e tristes, enquanto o Cedron rolava na sua quietude como um lençol de águas mornas, procurando um mar morto. (19 Abr 1935).

“Crônicas de Além-Túmulo”, psicografado por Chico Xavier – FEB Editora

Quem é quem e onde

Caifás: sumo sacerdote judeu, que fez condenar Jesus e perseguiu os apóstolos.
Cedron: torrente da Judéia que separa Jerusalém do Monte das Oliveira e deságua no Mar Morto.
Constantino I: imperador romano (306 a 337 dC) que transferiu a capital para Bizâncio, transformando-a em Constantinopla (atual Istambul-Turquia). Sua vitória contra Maxêncio, junto aos muros de Roma, decidiu definitivamente o estabelecimento do Cristianismo como religião oficial do império.
Fogueira Inquisitorial: um dos métodos de execução utilizado pelo Tribunal do Santo Ofício ou Inquisição. Os defensores desse tipo de punição advogavam teologicamente que a queima do corpo físico significava a purificação e salvação da alma humana contaminada pela heresia. Entre as vítimas célebres da Inquisição católica consta a heroína francesa Joana D’Arc, acusada de bruxaria e mais tarde canonizada pela própria Igreja.
Getsêmani: aldeia perto de Jerusalém, onde estava o Jardim das Oliveiras e aonde Jesus passou uma noite de agonia.
Gólgota: ou Calvário, montanha perto de Jerusalém, onde Jesus foi crucificado.
Judéia: parte da Palestina entre o Mar Morto e o Mar Mediterrâneo; é o antigo Reino de Judá e atual região de conflito entre árabes e judeus.
Jerusalém: antiga capital da Judéia e hoje capital do Estado de Israel, nas margens do Rio Jordão. Cidade dos lugares sagrados como o Muro das Lamentações e o Santo Sepulcro. Na simbologia mística cristã é estabelecimento do Reino de Deus sobre a Terra.
Jeremias: um dos quatro grandes profetas de Israel (680-580 aC). Célebre autor das Profecias e das Lamentações sobre a ruína de Jerusalém.
Pôncio Pilatos: governador romano da Judéia que, talvez receando uma revolta popular, entregou Jesus Cristo aos juízes religiosos hebreus, apesar de saber que o mesmo não cometera nenhum crime.
Tetrarca da Galiléia: cargo de Herodes Antipa, um dos três filhos e herdeiros do reino da Judéia –de Herodes, o Grande-. Como governador (tetrarca) de uma terça parte da Judéia (a Galiléia) Herodes, a pedido de Pilatos, julgou Jesus e o condenou a morte. Antes já havia condenado João Batista.
Sinhedrin: juiz supremo do tribunal religiosos judaico (Sinhedrio).
Tito: imperador romano, filho de Vespasiano. Durante o reinado de seu pai, tomou e destruiu Jerusalém (70 dC), provocando a primeira diáspora (dispersão) dos judeus pelo mundo.

(Fonte: jornal Última Hora, Abril de 1999)