Esse mundo dos fluidos, que
se entreve além do estado radiante, reserva bastantes surpresas e descobertas à
Ciência. Inumeráveis são as variedades de formas que a matéria, tornando-se
sutil, pode revestir para as necessidades de uma vida superior.
Já muitos observadores sabem
que, fora das nossas percepções, além do véu opaco que nossa espessa
constituição apresenta, existe um outro mundo, não mais o dos infinitamente
pequenos, porém um Universo fluídico completamente povoado de multidões
invisíveis.
Seres sobre-humanos, mas não
sobrenaturais, vivem junto de nós, testemunhas mudas dos nossos atos, e só
manifestando a sua existência em condições determinadas, sob a ação de leis
naturais, exatas, rigorosas. Importa penetrar o segredo dessas leis, porque de
seu conhecimento decorrerá para o homem a posse de forças consideráveis, cuja
utilização prática pode transformar a face da Terra e a ordem das sociedades. É
esse o domínio da Psicologia experimental; outros diriam o das ciências
ocultas.
Essas ciências são tão
velhas quanto o mundo. Já falamos dos prodígios efetuados nos lugares sagrados
da Índia, do Egito e da Grécia. Não está em nosso programa nos estendermos
demasiado sobre esta ordem de fatos, mas há uma questão conexa que não devemos
deixar passar em silêncio: é a do Magnetismo.
O Magnetismo, estudado e
praticado secretamente em todas as épocas da História, vulgarizou-se sobretudo
nos fins do século XVIII. As academias ainda o encaram como suspeito, e foi sob
o novo nome de Hipnotismo que os mestres da Ciência resolveram-se a admiti-lo,
um século depois do seu aparecimento.
“O Hipnotismo, diz o Sr. de
Rochas, até hoje estudado só oficialmente, não é senão o vestíbulo de vasto e
maravilhoso edifício, já em grande parte explorado pelos antigos investigadores.”
Infelizmente, os sábios
oficiais – quase todos médicos – que se ocupam do Magnetismo ou, como eles
próprios o dizem, de Hipnotismo, só fazem as suas experiências, geralmente,
sobre passivos doentes, sobre
internos de hospitais. A irritação nervosa e as afeições mórbidas desses passivos só permitem obter fenômenos
incoerentes, incompletos. Certos sábios parecem recear que o estudo desses
mesmos fenômenos, obtidos em condições normais, forneça a prova da existência
do princípio anímico no homem. É pelo menos o que resulta dos comentários do
Dr. Charcot, cuja competência ninguém certamente negará.
“O Hipnotismo, diz ele, é um
mundo no qual se encontram fatos palpáveis, materiais, grosseiros, que
acompanham sempre a Psicologia, ao lado de outros fatos absolutamente
extraordinários, inexplicáveis até hoje, que não correspondem a nenhuma lei
fisiológica, e inteiramente estranhos, surpreendentes. Ocupo-me dos primeiros e
deixo de lado os segundos.”
Assim, os mais célebres
médicos confessam que essa questão ainda está para eles cheia de obscuridade.
Em suas pesquisas, limitam-se a observações superficiais, desdenhando os fatos
que poderiam conduzi-los diretamente à solução do problema. A ciência
materialista hesita em aventurar-se no terreno da Psicologia experimental, pois
sente que ali se acharia em presença das forças psíquicas, da alma enfim, cuja
existência tem negado com tanta tenacidade.
Seja como for, o Magnetismo,
repelido pelas corporações sábias, começa sob outro nome a atrair-lhes a
atenção. Os resultados seriam, porém, muito mais fecundos se, ao invés de
operarem sobre histéricos, experimentassem sobre indivíduos sãos e válidos. O
sono magnético desenvolve, nos passivos
lúcidos, faculdades novas, um poder incalculável de percepção. O mais
notável fenômeno é a visão a grande distância, sem o auxílio dos olhos. Um
sonâmbulo pode orientar-se durante a noite, ler e escrever com os olhos
fechados, entregar-se aos mais delicados e complicados trabalhos. Outros veem
no interior do corpo humano, discernem seus males e causas, leem o pensamento
no cérebro, penetram, sem o concurso dos sentidos, nos mais recônditos domínios e até no
vestíbulo do outro mundo. Sondam os mistérios da vida fluídica, entram em
relação com os seres invisíveis, transmitem-nos seus conselhos, seus ensinos.
Mais adiante voltaremos a este ponto, porém desde já podemos considerar como
estabelecido o fato que decorre dos estudos, das experiências de Puységur,
Deleuze, du Potet e de seus inumeráveis discípulos, isto é, que o sono
magnético, imobilizando o corpo, aniquilando os sentidos, restitui à liberdade
o ser psíquico, centuplica lhe os meios íntimos de percepção e o faz entrar num
mundo vedado aos seres corpóreos, mundo cujas belezas e leis nos descreve.
E esse ser psíquico que, no
sono, vive, pensa, age fora do corpo, que afirma sua personalidade independente
por um modo especial de apreciação, por conhecimentos superiores aos que
possuía no estado de vigília, que será senão a própria alma, não mais uma
resultante das forças vitais dos órgãos, porém uma causa livre, uma vontade
ativa, desprendida momentaneamente de sua prisão, pairando sobre a natureza
inteira e gozando a integridade de suas faculdades inatas?
Assim, pois, os fenômenos
magnéticos tornam evidente não só a existência da alma, mas também a sua
imortalidade; porque, se, durante a existência corpórea, essa alma se desliga
do seu grosseiro invólucro, vive e pensa fora dele, com mais forte razão achará
na morte a plenitude de uma liberdade.
A ciência do Magnetismo não
só nos leva a crer na existência da alma, mas também nos dá a posse de
maravilhosos recursos. A ação dos fluidos sobre o corpo humano é considerável;
suas propriedades são múltiplas, variadas. Fatos numerosos têm provado que, com
o seu auxílio, se podem aliviar os sofrimentos mais cruéis. Os grandes
missionários não curavam pela oposição das mãos? Eis todo o segredo dos seus
supostos milagres. Os fluidos, obedecendo a uma poderosa vontade, a um ardente
desejo de fazer o bem, penetram os organismos debilitados e suas moléculas
benéficas, substituindo as que estão doentes, restituem gradualmente a saúde
aos enfermos, o vigor aos valetudinários.
Objetam que uma legião de
charlatães, para explorar o Magnetismo, abusa da credulidade e da ignorância do
público, exornando-se com um poder imaginário. Mas, isso é uma consequência
inevitável do estado de inferioridade moral da Humanidade.
Uma coisa nos consola desses
fatos contristadores: é a certeza de que todo homem animado de simpatia
profunda pelos deserdados, de verdadeiro amor pelos que sofrem, pode aliviar
seus semelhantes por uma prática sincera e esclarecida do Magnetismo.
Léon Denis
Depois da Morte
[i] Les États Profonds de l’Hypnose, pelo
Coronel de Rochas, pág. 75.
[ii] O sujet vê as células cerebrais
vibrarem sob a influência do pensamento e compara-as a estrelas que se dilatam
e se contraem sucessivamente. (Les Ëtats
Profonds de l’Hypnose pelo Coronel de Rochas, diretor da Escola Politécnica
de Paris.) A respeito, o professor Th. Flournoy, da Universidade de Genêve,
escrevia: “Basta consultar a literatura médica mais recente para encontrar, sob
a pena de autores insuspeitos de misticismo, exemplos de vista interna. De uma
parte, temos psiquiatras franceses que acabam de publicar alguns casos de
alienados que apresentaram, poucos dias antes de seu fim, um melhoramento tão súbito
quão inexplicável, ao mesmo tempo em que o pressentimento de sua morte próxima.
De outra parte, há o caso de sonâmbulos que têm a visão clara de suas vísceras,
às vezes abrangendo mesmo a sua estrutura íntima; este fato vem, pela primeira
vez, transpor os limites da Ciência sob o nome de autoscopia interna ou
auto-representação do organismo. E, por uma divertida ironia da sorte, essa
novidade vem apoiada por aqueles que se reconhecem defensores de uma escola que
pretende rejeitar toda explicação psicológica desses fatos.” (Archives de Psychologie, agosto, 1903.)
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